MODOS DE SEGREGAÇÃO: PROPOSTAS DE LEITURA CRÍTICA



O texto abaixo foi minha proposta de agenciamento selecionada para participação do grupo Visibilidades no seminário CORPOCIDADE 5, que aconteceu entre 05 a 09 de dezembro de 2016, em Salvador.
O gif acima foi resultado de uma leitura crítica que fiz dentro da proposta no grupo, sobre a festa de Nossa Senhora da Conceição da Praia que acontecia durante o seminário.

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Proponho um estudo de visibilidades na relação dos modos de fazer cidade com os processos de segregação e de disputa por ocupação e uso do Centro Histórico de Salvador (CHS), entre diferentes grupos socioeconômicos e com recorte de estudo entre a Rua Chile, a Praça Castro Alves, as Ladeiras da Montanha e da Conceição e o entorno destes lugares. Este recorte tem uma relação direta com nosso interesse pelos efeitos urbanos e sociais do modo de criar e perpetuar diversas formas de segregação urbana e na compreensão de suas nuances e representações no tempo e no espaço.

Proponho uma aproximação aos sujeitos e assujeitados, implicados ou não neste recorte de gesto/espaço (segregação/CHS), incluindo este grupo de estudo (GE) como sujeito deste campo de disputas onde estamos suscetíveis aos movimentos e ações do fazer cidade segregada. Esta aproximação consiste em um exercício de provocar a memória para fazer surgir um repertório de experiências entre os participantes, para emergir sobrevivências deste gesto/espaço, colecionando-as e  reunido-as em repertório (palavras, imagens, sons). Como suporte ao exercício trazemos a ideia de engrama para falar do gesto na memória.

No CHS, a demarcação do poder pela segregação, pelas diferenças sociais e econômicas se refaz ao longo do tempo. Segregação está presente no modo de fazer a cidade desde o seu núcleo inicial a cidadela (cidade murada), estabelecendo regras e costumes baseados essencialmente em critérios de a raça e status social, marcando de forma profunda as relações entre os que, de um modo ou de outro a vivenciaram.

Nestes critérios estão incutidos historicamente, sob o grande guarda-chuva do preconceito e da hierarquização das relações, um cotidiano repleto de mensagens (imagens, gestos, palavras) de segregação que no tempo se fizeram sutis ou se explicitaram ao reboque dos conflitos e das disputas. Estas mensagens ficaram na nossa memória coletiva e ressurgem nos sinalizando, a depender de que lado estamos, para os modos de segregar.

Reconhecemos na palavra engrama o nome das marcas destas mensagens na memória individual e coletiva que se fixam a partir de eventos de grande impacto emocional. O engrama foi utilizada pelo historiador alemão Aby Warburg¹ na formulação do seu método de pesquisa sobre a história da arte, como uma das noções que o apoiaram na leitura anacrônica da história.

O engrama em Warburg possui um caráter polar que articula pares opostos (como dentro – fora) e permite avançar na análise e compreensão da vida póstuma, oferecendo “uma possibilidade de reaparição de uma coisa que ficou morta no passado.” (Warburg, 2015)². O engrama evoca também a memória social e faz o “rearranjo das representações” materiais disponíveis podendo promover encontros de visibilidades dos modos de segregação e disputa por ocupação e uso no CHS.

Solange Valladão
texto e imagens
 Notas:

1. Aby Warburg (1866 – 1922) foi um historiador de arte e teórico cultural alemão. Fundou a Biblioteca Warburg. Seu principal tema de pesquisa foi o legado da Antiguidade Clássica, com foco em sua transmissão ao longo dos séculos, nas mais variadas áreas da cultura ocidental, por meio do Renascimento (WARBURG, 2015).
2. WARBURG, Aby: Histórias de fantasma para gente grande: escritos, esboços e conferências. WAIZBORT, L. (Org). São Paulo. Ed. Companhia das Letras, 2015

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